International Standard Serial Number: ISSN 2357-9293

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Regime da desoneração da folha de salários – Principais Alterações introduzidas pela Instrução Normativa RFB n° 1.436/2013

por Cristiane I. Matsumoto Gago
Associada da área Previdenciária de Pinheiro Neto Advogados

 

Introdução

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 195, parágrafo 13º, acrescentado pela Emenda Constitucional n° 42, de 2003, estabeleceu, para fins de financiamento da Seguridade Social, a desoneração da folha de salários por uma contribuição incidente sobre a receita ou faturamento.

Diante do referido comando constitucional, foi editada a Medida Provisória n° 540, 3.8.2011[1], que alterou a matriz previdenciária de diversos setores econômicos, com a substituição da contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a remuneração paga aos segurados empregados, avulsos e contribuintes individuais (artigo 22, da Lei 8.212, de 24.7.1991), pela contribuição social incidente sobre receita bruta (“contribuição previdenciária sobre a receita bruta”), como forma de estimular a empregabilidade, a competitividade, a formalização da mão de obra e a redução dos custos de produção e exportação.

A contribuição previdenciária sobre a receita bruta não alterou a forma do recolhimento da contribuição ao Seguro Acidente do Trabalho (“SAT”)/Risco Acidente do Trabalho (“RAT”), do índice Fator Acidentário de Prevenção (“FAP”), das contribuições destinadas a Terceiras Entidades e das contribuições devidas pelos segurados empregados e contribuintes individuais.

As empresas sujeitas às novas regras de cálculo para o pagamento das contribuições previdenciárias permanecem obrigadas ao cumprimento das demais obrigações previstas na legislação previdenciária, em especial as acessórias.

As contribuições calculadas sobre a receita bruta têm caráter impositivo aos contribuintes que exerçam as atividades abrangidas pela Lei n° 12.546/2011. Ou seja, a empresa está obrigada a enquadrar-se nas novas regras introduzidas pela Lei n° 12.546/2011.

A legislação atual que dispõe sobre a contribuição previdenciária sobre a receita bruta é composta pela Lei n° 12.546/2011, pelo Decreto n° 7.828, de 16.10.2012 (“Decreto n° 7.828/2012”) e recentemente pela Instrução Normativa RFB n° 1.436, de 30.12.2013 (“IN RFB n° 1.436/2013”).

A IN RFB n° 1.436/2013 regulamentou as contribuições previdenciárias sobre a receita bruta e a sua operacionalização. Nesse contexto, abordaremos as principais alterações introduzidas pela IN RFB n° 1.436/2013.

Principais alterações introduzidas pela IN RFB n° 1.436/2013

De acordo com o artigo 17 da IN RFB n° 1.436/2013 para as empresas nas quais a substituição previdenciária sobre a folha de pagamento pela contribuição sobre a receita bruta estiver vinculada ao seu enquadramento no CNAE, como regra geral, deverá ser observado apenas o CNAE relativo à sua atividade principal, assim considerada aquela de maior receita auferida ou esperada.

Note-se que os parágrafos 2º e 3º do artigo 17 da IN RFB n° 1.436/2013 estabelecem que será considerada (i) "receita auferida" aquela apurada com base no ano-calendário anterior, que poderá ser inferior a 12 (doze) meses, quando se referir ao ano de início de atividades da empresa; e (ii)"receita esperada" como sendo uma previsão da receita do período considerado e será utilizada no ano-calendário de início de atividades da empresa.

Cabe salientar que o disposto nos parágrafos 2º e 3º do artigo 17 da IN RFB n° 1.436/2013 extrapola as regras contidas na Lei n° 12.546/2011, a qual somente determinou que as empresas, cujo CNAE principal esteja sujeito à regra da desoneração da folha de salários, deverão aplicar a alíquota de 1% ou 2% sobre a receita bruta de todas as suas atividades (CNAE principal e secundário), sem referir-se a qualquer período, para fins de definição da receita auferida ou esperada.

Outra alteração introduzida pela IN RFB n° 1.436/2013 está relacionada ao fato de que o seu artigo 3º determina que somente as exportações diretas (exceto as exportações via trading companies) estão excluídas da base de cálculo da contribuição previdenciária sobre a receita bruta. Contudo, entendemos que o referido dispositivo viola o disposto no artigo 149 da CF/88 (redação dada pela Emenda Constitucional nº 33/2011), por meio do qual foi criada a regra de imunidade das contribuições sociais para todas as receitas decorrentes de exportação, dentre as quais se incluem as contribuições previdenciárias.

Sobre o tema, em casos análogos, cabe destacar decisões dos Tribunais Regionais Federais[2] que excluíram da base de cálculo da contribuição previdenciária (receita bruta proveniente da comercialização de produção rural) devida pelas agroindústrias e produtores rurais pessoas jurídicas as receitas decorrentes de exportação indireta.

A IN RFB n° 1.436/2013 ainda equiparou os consórcios a empresas (artigo 1º). Note-se que essa alteração foi inicialmente introduzida pela Medida Provisória n° 634/2013 que alterou o artigo 9º da Lei n° 12.546/2011. De acordo com a atual legislação específica, o consórcio que realizar contratação e pagamento, mediante utilização de CNPJ próprio, de pessoas físicas ou jurídicas, com ou sem vínculo empregatício, será beneficiado com o regime da desoneração da folha de salários, desde que suas atividades estejam listadas na Lei n° 12.546/2011 e IN RFB n° 1.436/2013. Além disso, a IN destaca que as empresas consorciadas passam a ser solidariamente responsáveis por tributos relacionados a operações praticadas pelo setor.

Além disso, a IN RFB n° 1.436/2013 regulamentou as questões envolvendo a incidência das contribuições previdenciárias sobre a remuneração apurada em sentença trabalhista, em relação às empresas sujeitas ao regime da desoneração da folha de salários.

No cálculo da contribuição previdenciária devida em decorrência de decisões condenatórias ou homologatórias proferidas pelos Juízes e Tribunais do Trabalho, será aplicada a legislação vigente na época da prestação de serviços.

De acordo com o artigo 18 da IN RFB n° 1.436/2013 para o período em que a empresa já estava sujeita ao regime da desoneração da folha de salários, quando da prestação dos serviços, cabe a ela declarar à Justiça do Trabalho, em relação à época a que se refere à reclamação trabalhista, os períodos em que esteve enquadrada no novo regime (receita bruta). Nesta situação, não haverá incidência das contribuições previdenciárias sobre a folha de salários, relativas às respectivas competências.

Por fim, a IN RFB n° 1.436/2013 tratou dos procedimentos relacionados à compensação da retenção previdenciária com a contribuição substitutiva incidente sobre a receita bruta da Lei n° 12.546/2011.

Sobre o tema, de acordo com a legislação específica, as empresas que prestam serviços de Tecnologia da Informação – TI, Tecnologia da Informação e Comunicação – TIC, call center, transporte rodoviário coletivo de passageiros, transporte aéreo de passageiros, dentre outras atividades (artigo 9º da IN RFB n° 1.436/2013), com cessão de mão de obra, estão sujeitas à nova alíquota de 3,5%, a título de retenção previdenciária.

De acordo com o artigo 9º da IN RFB n° 1.436/2013 a retenção previdenciária de 3,5% poderá ser compensada pela empresa cedente de mão de obra, quando do recolhimento das contribuições destinadas à Seguridade Social devidas somente sobre a folha de pagamento dos segurados a seu serviço. Restando saldo em favor da empresa cedente de mão de obra, esta poderá compensá-lo nas competências subsequentes, devendo ser declarada em GFIP na competência de sua efetivação, ou requerer a sua restituição. Enfim, com base na legislação atual não está autorizada a compensação dos valores retidos à alíquota de 3,5% com valores recolhidos da contribuição previdenciária sobre a receita bruta.

Nesse cenário, embora a Lei n° 12.546/2011 (com redação dada pela Lei n° 12.715/2012) tenha trazido uma redução na alíquota da retenção previdenciária de 11% para 3,5% para algumas empresas sujeitas ao regime da desoneração da folha de salários, por outro lado, não criou meios para que esse valore retido pelas empresas contratantes seja compensado de maneira eficaz pelas empresas cedentes de mão de obra.

Conclusão

Podemos observar que algumas inovações trazidas pela IN RFB n° 1.436/2011 são ilegais e inconstitucionais, pois violam o princípio da legalidade ao ampliar a base de cálculo da contribuição sem o fazer por meio de lei, ao mesmo tempo em que ferem o princípio da anterioridade, ao determinar esta ampliação de forma retroativa, como ocorreu no caso da definição de receita auferida ou esperada para fins atribuição do CNAE principal (artigo 17) e da inclusão da receita bruta decorrente de exportação indireta na base de cálculo da contribuição previdenciária sobre a receita bruta (artigo 3°). Esse descompasso desmerece a intenção do legislador e não poderá ter guarida no ordenamento jurídico brasileiro, tema este que deverá ser enfrentado pelo Poder Judiciário.



[1] Essa Medida Provisória foi convertida e deu origem à Lei 12.546, de 14 de dezembro de 2011.

[2] (Agravo de Instrumento nº 257.656, Processo 2006.03.00.003034-0/SP, 1ª Turma, Rel. Juiz Johonsom Di Salvo, TRF 3ª Região, DJU 31.08.2006)

(Agravo de Instrumento nº 2006.01.00.030547-2/GO, Relator Desembargador Federal Leomar Barros Amorim de Sousa, TRF 1º Região)