Ganhos na realização de ativos (conceitos de “ativo permanente” x “ativo não-circulante”) – modificação na legislação societária – contribuição das contribuições PIS/COFINS

por Carlos Eduardo de Barros Salles
Advogado
Graduado em 2009 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ
Pós-graduado  em Direito Financeiro e Tributário pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em 2012
Inscrito na OAB/RJ pelo nº 164.007
Atuação nas áreas de Direito Tributário
Ana Carolina Liporace de Souza
Advogada
Graduada em 2012 pela Pontifícia Universidade Católica – PUC/RJ
Pós-graduanda em Direito Societário e Mercado de Capitias pela Fundação Getúlio Vargas
Inscrita na OAB/RJ RJ pelo nº 179.459
Atuação nas áreas de Direito Societário e Contratos


A Lei nº 6.404/1976 (Lei das S.A.) é fonte de diretrizes básicas da contabilidade societária brasileira, que se revelam como sendo de grande importância não apenas perante os aspectos contábil e tributário das companhias, mas também junto às relações e atividades do grupo social que as compõem[1]. Nesse sentido, pode-se considerar que tais diretrizes funcionam como mecanismos de controle e fiscalização dos atos da administração por parte dos acionistas, tendo ainda uma segunda finalidade, a de auxiliar os próprios administradores à nortear e orientar os negócios da companhia[2].

Porém, apesar deste diploma legal tratar da organização das sociedades anônimas, o Padrão Contábil por ela definido e as multiplas funções por ele desempenhadas, estendem-se, em diversas situações, aos demais tipos societários.

O Padrão Contábil, regido pela Lei 6.404/1976, a fim de proporcionar uma adequada representação da estrutura patrimonial e financeira das sociedades, conta com alguns tipos de demonstrações contábeis (ou demonstrações financeiras), as quais acabaram sofrendo uma série de alterações com a promulgação das Leis nº 11.638/2007 e da Medida Provisória nº 449/2008 (convertida na Lei nº 11.941/2009).

O principal objetivo das alterações sofridas foi a atualização das regras contábeis brasileiras, para harmonizá-las com os pronunciamentos internacionais, em especial aos emitidos pelo International Accouting Standarts Board (IASB), através dos International Financial Reporting Standards (IFRS), bem como tornar mais claro e transparente o conteúdo destas informações.

Uma das demonstrações contábeis criadas pela Lei 6.404/1976, as quais as sociedades são obrigadas a elaborar e publicar, é o Balanço Patrimonial, composto dos seguintes grupos de contas: Ativo, Passivo Exigível e Patrimônio Líquido.

Até o ano de 2008 o Ativo se subdividia em Circulante e Permanente, sendo que esse último, de acordo com o artigo 178 da Lei 6.404/1976, com a redação dada pela Lei 11.638, de 2007, era formado por outros quatro subgrupos: Investimento, Imobilizado, Intangível e Diferido.

A partir da vigência da MP nº 449, no mês de dezembro de 2008, o artigo 178, da Lei 6.404/1976, mais uma vez visando obter uma maior padronização com as regras contábeis internacionais, foi novamente modificado, desta vez para alterar a denominação de Ativo Permanente, para Ativo Não-Circulante.

O Ativo Não-Circulante, em regra, bem como seu antecessor, abrange todos os bens e direitos de permanência duradoura no patrimônio da sociedade, ou seja, aqueles que não serão “realizados” antes do término do exercício social subsequente, e também se divide em subgrupos, quais sejam: i) realizável a longo prazo, ii) investimentos, iii) imobilizado, e iv) intangível.

 Nesse contexto contábil, é importante ter em mente que a expressão “realizável” representa uma transformação, conversão ou mudança do status quo do bem que integra o Ativo da sociedade. Desta forma, por exemplo, um bem imóvel alocado no Ativo Não-Circulante de uma sociedade, mais especificamente no subgrupo de contas classificado como Imobilizado, ao ser alienado, e consequentemente, “transformado” em dinheiro, contabilmente, está sendo “realizado”, reingressando no resultado da sociedade (patrimônio líquido), em termos práticos, na forma de receita.

Isto porque, receita para fins de contabilidade, conforme esclarece o Glossário disponibilizado pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis, pode ser entendida como o:

“aumento de benefícios econômicos durante o período contábil na forma de entradas ou aumentos de ativos ou reduções de passivos que resultam em aumento no patrimônio líquido (...)””

Conclui-se, portanto, que do ponto de vista contábil, os ganhos referentes à “realização” de qualquer bem ou direito que integra o Ativo da sociedade será contabilizado, no seu resultado, como um tipo de receita.

A Emenda Constitucional nº 20, de 1998, conferiu nova redação ao artigo 195, inciso I, da Constituição Federal, para ampliar a base de cálculo do PIS e da COFINS, contribuições destinadas ao financiamento da seguridade social, para englobar, sem discriminação, qualquer receita do contribuinte:

Por outro lado, as Leis nº 10.637/2002, e 10.833/2003, permitiam às Pessoas Jurídicas inseridas no regime não cumulativo do PIS e da COFINS, excluírem da base de cálculo dessas contribuições, algumas receitas originadas da alienação de bens do Ativo.

No caso do PIS, era possível excluir do cálculo as receitas não operacionais, originadas pela venda de partes do ativo imobilizado, já para fins de cálculo da COFINS, não se considerava as receitas não-operacionais, decorrentes da venda de bens e direitos integrantes do ativo permanente.

Percebe-se, que de acordo com tais leis, um número limitado de bens que compõe o Ativo de uma sociedade poderiam ter os eventuais ganhos, originados com a sua realização, excluídos da base de cálculo dessas contribuições sociais.

Entretanto, a MP 627/2013 altera ambos os dispositivos legais, permitindo que a partir 01/01/2015 (data em que entra em vigor), todas as sociedades inseridas no regime não-cumulativo do PIS e da COFINS possam excluir do cálculo dessas contribuições as receitas auferidas com a venda de bens do ativo não circulante, classificado como investimento, imobilizado ou intangível.

Quanto às sociedades inseridas na sistemática cumulativa do PIS e da COFINS, a MP 627/2013, também traz alteração em relação à realização de máquinas, equipamentos e outros bens importados incorporados no Ativo Imobilizado, pois permite que os valores decorrentes do ajuste a valor presente sejam considerados para a apuração do crédito, desconsiderando, porém, os ganhos e perdas originados pela avaliação do Ativo com base no valor justo.

Apesar da MP nº 627/2013, como visto acima, permitir um número maior de exclusões, tal diploma está longe de encerrar os debates a respeito da base de cálculo dessas contribuições, haja vista que alterou também o artigo 12 do Decreto-Lei no 1.598/77, definindo assim um novo conceito de receita bruta.

Se antes da MP nº 627/2013, considerava-se receita bruta como o “produto da venda de bens nas operações de conta própria e o preço dos serviços prestados”, a partir de sua vigência, será incluído neste conceito os resultados auferidos nas operações em conta alheia, demais receitas decorrentes da atividade ou objeto principal das pessoas jurídicas (mesmo que elas não sejam exatamente decorrente da venda de bens e serviços), e dos tributos sobre ela incidentes, inclusive do próprio PIS/PASEP e da COFINS.

É importante ressaltar que já existem inúmeras manifestações, sobretudo, veiculadas na mídia especializada, contestando a constitucionalidade desta inciativa, sendo, assim, muito provável o aparecimento de questionamentos judicias, nos moldes dos atualmente existentes, como, por exemplo, o RE 240.785 (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS).

Nesse sentido, levando-se em consideração que a MP nº 627/2013 pretende alterar o conceito de “Receita Bruta”, para incluir qualquer ingresso que esteja relacionado à atividade ou objeto principal das pessoas jurídicas, o que, provavelmente, acarretará muitos debates na esfera judicial, ao menos para quem recolhe o PIS e da COFINS de maneira não cumulativa, a exclusão dos ganhos com a realização de alguns dos bens que compõe o seu ativo não-circulante, pode ser considerada sim uma importante modificação em prol dos contribuintes.

Faz-se ainda relevante contrapor que se do ponto de vista tributário e contábil as modificações legais ora abordadas estão levantando debates e possíveis questionamentos judiciais, no que se refere ao direito societário em si, mais especificamente sua parcela regida pela Lei 6.404/1976, tais mudanças vieram tão somente adequar a referida lei, a fim de possibilidar maior clareza e facilidade na interpretação legal societária a partir do devido alinhamento desta às atualidades nacionais e internacionais fiscais e contábeis. Tal atualização se mostra, assim, como uma medida legal, legítima e, ainda, benéfica ao contribuinte que se baseia na Lei 6.404/1976 para orientar suas atividades contábeis.

Vale, por fim, lembrar que apesar das alterações, promovidas pela MP nº 627/2013, relativas ao cálculo do PIS e da COFINS só entrarem em vigor em 2015, é facultado aos contribuintes optarem pela aplicação de seus efeitos no exercício de 2014.

Bibliografia e Referências

1.Coelho, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. São Paulo. Saraiva, 2010.
2.Coelho, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Volume 2. São Paulo. Saraiva, 2000.



[1] Coelho, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. São Paulo. Saraiva, 2010. p. 213-214

[2] Coelho, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Volume 2. São Paulo. Saraiva, 2000. p. 316